Alguns comentários sobre os 100 anos do Partido
Comunista Chinês
Por Milton Lima.
10-07-2021
Ao iniciar esse texto explorando minha formação
acadêmica na sociologia o faço por um acontecimento muito importante nesta
representação social. E dado à relevância do texto, e a insuficiência de
espaço/tempo para tal tratamento, minha proposta aqui é tecer alguns
comentários sobre a comemoração centenária chinesa com alguns marcos históricos
que considero de suma relevância societal.
Quando se trata de China (no século XXI, depois do
Covid-19) nosso imaginário é inundado com informação de todas as naturezas. De
fato tecer um pequeno comentário sobre a China, tem um grande significado no
sentido de olhar o mundo para compreender meu país (veja o final deste artigo).
Dito estas, algo importante para se contextualizar quando trago o lado
sociológico, é que a história desde os primórdios tem sido contada pelos
vencedores.
E se a história contada antes não girasse em torno do
poder dado há um ciclo de vencidos que procuram sua glória, poderia a história
ter sido outra? Hegel dizia que de tempos em tempos, o poder no mundo toma
outros ventos, e tudo leva a crer que esse vento sopra muito forte agora para o
lado oriental, ou seria outra história?
Aqui uma frase do país asiático, que merece atenção:
“Não importa se o gato é preto ou branco, o importante é que ele pegue os
ratos”. No sistema capitalista que o mundo aderiu o neoliberalismo, o que pode
ser interpretado por esta frase chinesa senão, diga democracia versus ditadura,
diga-se comunismo com riqueza capitalista, ou seria muita ousadia do sistema
que tem mais de 1 bilhão e 400 milhões de pessoas ter como meta a erradicação da
pobreza de sua população, algo em pleno horizonte?
O mundo que então é narrado pelos vencedores, ou
seja, pelos atores que têm o poder de contar e escrever a história, tal como é
lida pelos perdedores, ganhara cores e sabores de textos e aulas por uma
corrente de ferro. Os subalternos do terceiro mundo se quiserem, encontram os resultados
já prontos, sobretudo, quando olhamos os últimos dois séculos (XIX e XX)
marcados pelas mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais – muito
significativas na história (ver Hobsbawn, e contraponha a história oficial do
progresso).
E por ocasião dos 100 anos do Partido Comunista
Chinês, do qual trataremos aqui, a sociologia é sui generis quando se trata de ideologia deste mundo já dito sendo narrado
e escrito, tal como contado, pelos vencedores.
Pois bem, antes de adentrar o significado da
comemoração dos 100 anos do Partido Comunista Chinês, voltemos um tanto até o início do século XIX. Quando ali um
clássico na economia política era lido na Inglaterra (A riqueza das nações,
Adam Smith), a mesma que fora testemunha no século XVIII, de duas revoluções, a
Revolução Americana (um algoz de sua colônia inglesa) e a Revolução Francesa.
Primeiramente, é preciso contar que esse mundo de
novas relações sociais capitalistas teve em sua identidade os bens de consumo.
Um ponto de partida para a felicidade do indivíduo aqui propagada pelas teorias
econômicas, encontraria no discurso utilitarista um pai para chamar de seu, ‘Jeremy
Bentham’, com sua lógica da utilidade e felicidade individual. Outro grande
economista clássico que leu e propagou as ideias de Bentham foi David Ricardo
(a quem Marx leu com cuidado); filho de banqueiro e parlamentar, David Ricardo
teve um papel fundamental na transição da economia política burguesa. Aqui já
podemos citar que existia um conflito de classes, entre a burguesia e os
grandes fundiários aristocratas da época. A burguesia buscava mais direitos
para sua classe, o que, a aproximava da luta dos direitos dos trabalhadores nas
fábricas do século XIX (a história, porém, demonstra que tal luta fora moldada
por interesses próprios desta classe burguesa).
O papo sobre tais autores seria longo, e para encurtar,
apontamos Karl Marx, que foi um estudioso das teorias do dinheiro e do
trabalho, de alguns economistas, entre eles, Adam Smith e David Ricardo, para
depois apontar sua crítica no livro, “O Capital”. E sua tese principal é a luta
de classes, entre a burguesia e o proletariado, que era dividida entre os
proprietários dos meios de produção e os que vendiam sua força de trabalho. O
nível de exploração neste período era para uma escala mundial (e estruturado
pelo modelo de escravidão), sob a forma da desumanização dos trabalhadores –
que constituídos assim, sem humanidade, permaneciam nos pergaminhos da história
sem história.
Neste sentido, nosso percurso busca entender a
história hoje, mas sem perder de vista a luta de classes. As classes habitam o
coração da produção, e como diria Althusser “A teoria marxista pode ser
perfeitamente burguesa. Burguesa, é dizer, influenciada, marcada, penetrada
pela ideologia economicista ou sociológica burguesa”.
Se por um lado retornamos aos séculos XIX e XX, o
fazemos para chegar ao nascimento do Partido Comunista Chinês, em 1921. Por
outro lado nos aproximamos das ideias de Lênin e Marx, e já podemos trazer para
esta história uma personagem que é cravada na história chinesa a partir de
1949, falamos de Mao Zedong, um revolucionário do
Estado chinês.
No calor da comemoração chinesa, se nós voltarmos a
sua tradição, veremos que estamos tratando de uma sociedade milenar, e por
isso, de uma cultura muito peculiar. Significa para início de conversa dizer
que, tal texto não tem a pretensão de esgotar a complexidade que a envolve. veja mais sobre a política chinesa aqui
Também outra palavra que não se esgota aqui, é a
guerra nesta reflexão – tal como a ideologia e a revolução.
Para retomar a figura histórica de Mao Zedong (1893-1976), lembramos que ele
tomou contato com as ideias de Lênin, devido a seu trabalho na biblioteca de
Pequin, em 1918 – em qual foi auxiliar de um bibliotecário na universidade. No
ano de 1921, também participou da 3ª internacional em Shanghai na fundação do
Partido, que nasceu em 1921 como uma organização clandestina e inspirada pela
revolução russa em outubro de 1917.
Em 1925, Mao
era um dos líderes mais populares na organização das massas rurais chinesas,
quando escreveu o livro “Análises das classes na sociedade chinesa”, no mesmo
ano. Neste período já criava o ambiente para lutar contra o imperialismo, que se
acentuava a partir do ano de 1937, com a invasão japonesa, em julho daquele
ano. Mao lutou contra o
antifeudalismo, e em 1949 junto a sua presidência viu proclamada a República Popular
da China.
Desde a criação do Partido Comunista Chinês, a China
passou por grandes transformações, e um dos marcos nesta história é a revolução cultural de 1965, onde Mao teve um
grande protagonismo.
Enquanto poder de síntese da análise, o mais
importante compreender neste cenário, é que nos últimos 100 anos (1820-1920)
que precedem o nascimento do Partido Comunista Chinês, a luta na trincheira era
pelos direitos da classe operária. Os direitos foram conquistados, mas não sem
a luta, que não nos enganamos, é contínua e constante entre as classes. A
questão política a partir de então, toma um rumo que também merece nosso
destaque. Os termos colonialismo e imperialismo haviam construído na história do
poder dominante a conquista dos territórios. Tais territórios seriam por
Napoleão, logo após a Revolução Francesa, conquistados por meio da guerra. A
cultura de guerra já era alimentada desde a Grécia antiga. O que vale destacar neste
processo histórico na busca pelo poder soberano é que existe um hiato neste
percurso necessário, pois, não se pode dar conta de explicar um complexo mundo
de disputa de narrativas, sem entrar nas duas grandes guerras mundiais. Os seus
efeitos para o neoliberalismo são consideráveis para uma nova reorganização dos
impérios no mundo.
Entre o hiato que menciono acima, dado o destaque
para a reorganização do mundo, e não podendo aprofundar o contexto hegemônico
de disputa de imaginário, é válido pegar um eixo simbólico da disputa do poder
na luta de classe, que é a social-democracia.
O que Fukuyama (historiador) chamou de fim da
história, ganhou força com a queda do muro de Berlin, quando o mundo enfim se
rendia ao capitalismo. No mesmo vento que ganhou velocidade na história dos
anos 1990, em seu horizonte já se esperava um furacão chamado globalização. A
China neste contexto era um país de terceiro mundo, ou seja, um país
subdesenvolvido.
A social-democracia estava no retrovisor da
propagação da igualdade entre as disputas de narrativas, sob o como se deveria
contar a história, e a narrativa mais comum era aquela que o indivíduo
consumista no mundo neoliberal poderia ser feliz adquirindo o que ele quisesse
desde que lutasse por si próprio com seu esforço e mérito. Um ser livre para
buscar o sonho de ser aquilo que se desejava. E não o que o mundo o vendia?
O Estado então, liberal e social democrata,
desconsiderava e esvaziava o mundo real da luta de classes, e fazia assim a
gestão do controle das narrativas. Conquanto que o básico e ideal democrático,
continuasse sendo propagado com sua gênese enviesada na liberdade e igualdade,
vista pelos direitos iguais de todos, de modo que se isso não acontecesse, ou
seja, se o indivíduo não alcançasse o seu desejo, era por sua incompetência própria,
e não do sistema que o produziu livre para ser dono do seu próprio negócio
(ou seria sonho?).
O ônus de um mundo capitalista agora cobra sua conta
para os explorados e esquecidos na terra de sempre (ver Frantz Fanon), ou seja,
os explorados e sem vozes no mundo profundo da desigualdade.
Voltando para China, mas deixando em aberto o hiato aos
direitos iguais... (ou humanos?)
Pois bem, o neoliberalismo que sobrevive de crises,
em 2008 salvou os bancos. O que fez a China chegar à comemoração dos 100 anos
do Partido Comunista Chinês, tendo o que comemorar, vale o último comentário.
A história é cíclica como apontou Hegel. A disputa de
narrativa passa no momento pelo conhecimento de (AI) Inteligência Artificial,
tecnologia 5G, exploração do espaço, e a China se preparou para disputar esse
território global. Com o detalhe de que sua gestão estratégica é uma política
de governo. O investimento do país oriental na chamada nova rota da seda, diz muito sobre suas pretensões a nível global. Uma face
da mesma moeda que não podemos perder de vista neste contexto é o consumo, e o
quanto este ainda vai causar conflitos, que estão postos a toda comunidade
global. A China tem muito que comemorar, e também o que se preocupar, porque os
conflitos de classes estão dados desde sempre.
Quando olho para o meu país, vejo o quanto o Brasil
tem potencial para se tornar soberano como à China, mas infelizmente, a elite por
aqui vive repetindo comunista, pra cá e pra lá. O engraçado de notar que ninguém
nos manda ir morar na China, como é de práxis, e repetido, vai pra Cuba,
Venezuela...
Não se entende que ser soberano significa comprar
briga pelo poder. E que traduzir sua riqueza transformando-a em prosperidade
para seu povo, demanda antes de tudo, estratégia e conceito de nação. Sem isto,
há de se viver a colocar a culpa nos próprios cidadãos, com os dizeres que
estes não alcançam suas autonomias porque eles não se esforçaram o bastante.
Neste exato momento, o Brasil privatiza tudo, água, correios, energia elétrica,
dá autonomia para o banco central, entrega o que resta da Petrobrás, e o povo
por aqui vive a pensar que a culpa é dos comunistas, isto é Brasil...
Enquanto isso, a China continua caminhando com suas
parcerias estratégicas, com a Rússia e o Iran.
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